— Quem está no Cadastro Único, compra e fornece o CPF. Depois, é levantado o imposto que incidiu naquela compra, e devolve para as famílias, respeitando um teto — disse o secretário extraordinário para Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, durante palestra, citando que a reforma busca simplificar o sistema tributário e estimular o crescimento, e que o cashback é forma eficiente de política distributiva.
Por enquanto, a estimativa é que na reforma tributária a alíquota sobre o consumo no futuro IVA seja de 25%, uma das mais altas do mundo. Para o tributarista Roberto Quiroga, sócio-diretor do escritório Mattos Filho, na teoria, o cashback traz mais justiça tributária do que a desoneração de produtos da cesta básica:
— A desoneração de produtos beneficia ricos e pobres.
Renata Emery, sócia tributária do TozziniFreire Advogados, observa que há estudos mostrando que a devolução de impostos tende a ser mais regressiva, ou seja, reduz o alto peso dos impostos para a população mais pobre, do que a desoneração da cesta básica.
Medida alcança 72 milhões
Auferir os resultados dessa política tributária é um pilar importante, defende o advogado Samir Choaib, sócio do Choaib, Paiva e Justo Advogados:
— A ideia tem mote interessante, e pode incentivar a formalização com emissão de notas fiscais. É preciso acompanhar para ver os efeitos.
A devolução de impostos vem sendo proposta por diversos centros de estudos fiscais, além do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Mas poucos países adotaram o modelo em razão da complexidade.
No Japão foi implementado sistema de devolução de impostos para os mais pobres nos bens de maior consumo. A dificuldade foi fiscalizar o consumo d para contabilizar o valor a ser ressarcido.
O Canadá é considerado referência do cashback. Com um IVA único, o país dá contrapartida de créditos tributários para famílias de baixa renda, alcançando 9 milhões de pessoas ou 25% da população. As transferências variam de acordo com o tamanho da família, número de filhos menores e renda. Por ano, a devolução pode chegar a até US$ 2.400 canadenses (R$ 9.744).
Mas os créditos devolvidos no país somam 5% do total de benefícios sociais, o que significa que têm pouco impacto na redução da desigualdade, segundo especialistas.
Nos EUA, há devolução de parte dos impostos para trabalhadores de baixa renda com filhos e outros dependentes, com base nos impostos pagos. O crédito é e exercido na declaração anual de Imposto de Renda como uma restituição.
No Brasil, um exemplo está em vigor desde 2021 no Rio Grande do Sul e prevê a devolução de parte do ICMS à população de renda mais baixa, entre um a três salários, divididos em três faixas.
Ricardo Neves Pereira, subsecretário da Receita do estado explicou que na primeira etapa foi estimado o valor gasto das famílias beneficiadas e chegou-se a uma carga de 10% do ICMS sobre a renda. O valor de devolução foi de R$ 100 a cada trimestre, para famílias inscritas no Cadastro Único.
— Para as famílias que ganham até um salário, a carga tributária desse imposto foi reduzida em 50% — disse Neves, citando que o crédito é feito por meio de um cartão.
Um levantamento mostrou que a primeira parcela do benefício foi destinada a itens de primeira necessidade, sendo que 83% foram usados para compras em supermercados, atacados, açougues, restaurantes e padarias.
Na nova fase do programa, iniciada ano passado, as famílias estão sendo incentivadas a pedir nota fiscal e informar o CPF, reduzindo a informalidade dos serviços e do comércio. Com isso, a devolução será variável. Até agora, o programa gaúcho beneficiou quase 620 mil famílias com a devolução de R$ 278 milhões.
Estudo feito pelo movimento Pra Ser Justo, composto por entidades e organizações da sociedade civil, mostrou que após a unificação dos cinco tributos sobre o consumo (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) seria possível alcançar 72,4 milhões de pessoas na base da pirâmide de renda com a devolução mensal de até R$ 13,22 por pessoa. Esse cashback custaria R$ 9,8 bilhões por ano, cerca de metade do que o governo deixa de arrecadar com a desoneração da cesta básica.
O cashback, entretanto, não é unanimidade. Entre as críticas estão a complexidade de implementação, fiscalização e a dificuldade de chegar a famílias nos rincões do país, além da possibilidade de fraude.
Fernando Gaiger Silveira, técnico de planejamento e pesquisa do IPEA, afirma que os valores devolvidos são muito baixos e têm impacto reduzido na melhoria de vida:
— Essa ideia tem apelo para vender uma reforma tributária que ajuda os pobres. Mas quem consome mais serviços são os ricos, portanto, poderíamos trazer o setor para uma tributação maior.
Róber Iturriet Avila, diretor do Instituto de Justiça Fiscal e professor de Economia da UFRGS, a devolução de impostos exige burocracia que torna o programa complexo:
— São indivíduos que por vezes não têm sequer CPF cadastrado, quanto mais registro nas Secretarias de Fazenda. E grande parte das compras é feita no mercado informal, sem nota fiscal.
Experiências no Brasil e no mundo
- Canadá: País é considerado referência e dá contrapartida de créditos tributários para famílias de baixa renda, alcançando 9 milhões de pessoas ou 25% da população. Mas os créditos devolvidos somam 5% do total de benefícios sociais.
- Estados Unidos: O governo oferece devolução de parte dos impostos a trabalhadores de baixa renda com filhos e outros dependentes, com base nos impostos pagos. O crédito é e exercido na declaração anual de Imposto de Renda como uma restituição.
- Rio Grande do Sul: Programa devolve parte do ICMS pago por famílias com renda de um a três salários mínimos. Elas estão sendo incentivadas a pedir nota fiscal e informar o CPF, o que reduz a informalidade. Foram contempladas até agora 620 mil famílias.
Fonte: O GLOBO