NA MÍDIA Juro real sobe em meio a batalha do BC contra expectativas de inflação Para economistas, queda sustentada depende de credibilidade fiscal

queda da inflação nos últimos meses pode ser explicada por uma combinação de redução de tributos, queda de preços de commodities em reais e efeito da política monetária.

Para que esse processo se mantenha nos próximos meses, no entanto, será necessário acrescentar nessa equação uma solução para o problema fiscal desenhado para 2023, que afeta as expectativas de inflação e, desse modo, o juro real.

A taxa real de juros pode ser medida pela diferença entre as expectativas para os juros e para a inflação nos próximos 12 meses. Atualmente, está em 8,2% ao ano, segundo cálculo da MCM Consultores, que considera a média no atual trimestre. É o maior valor em uma lista tem 40 países, segundo o rankingda gestora Infinity Asset Management.

Esse é o maior nível em sete anos, desde os quase 10% alcançados no início do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff (PT).

Mesmo com a taxa básica de juros mantida em 13,75% ao ano por um longo período, como indicou o Copom(Comitê de Política Monetária do Banco Central) na sua última reunião, o aperto monetário deve crescer nos próximos meses, levando o juro real a aumentar ainda mais.

A economista do Itaú Unibanco Julia Gottlieb afirma que a queda recente da inflação é uma combinação entre redução de impostos, preço de commodities e efeitos de política monetária. O indicador diário de atividade da instituição (Idat), por exemplo, mostra desaceleração em setores mais ligados a crédito, como móveis, eletrodomésticos e veículos, há algum tempo, reflexo da alta dos juros.

“Se a gente olhar o juro real, só passou acima do patamar neutro no último trimestre do ano passado, ficou mais contracionista ao longo deste ano, e o efeito maior disso tende ainda a aparecer ao longo do segundo semestre e de 2023”, afirma.

Ela diz que a intensidade e o início do ciclo de corte de juros ficarão condicionados à sinalização de como vai ser o arcabouço fiscal, e como vai evoluir a atividade econômica e os impactos disso sobre a inflação.

O economista Silvio Campos Neto, sócio da Tendências Consultoria, afirma que grande parte da queda recente da inflação está ligada a preços de commodities e corte de tributos, mas que, sem a atuação do BC, a economia estaria ainda mais aquecida, e a inflação mais pressionada.

Segundo o economista, a inflação foi impulsionada pelos choques de oferta provocados pela pandemia e pela Guerra da Ucrânia, mas tem também um componente de demanda. E o BC deve agir para evitar que esses choques sejam repassados para toda a economia.

“O BC se antecipou neste ajuste e agora está terminando, enquanto outros bancos centrais ainda estão talvez na metade do processo. Mesmo com a Selic parada agora, fatalmente vai ter uma taxa de juros real crescente nos próximos meses.”

José Júlio Senna, ex-diretor do BC e chefe do Centro de Estudos Monetários do FGV Ibre, afirma que o Brasil está vivendo um momento de convergência de vários fatores que estão ajudando a trazer a inflação e as expectativas para baixo. Entre eles, a atuação do BC.

Mas ele diz que esse cenário de melhora pode ser revertido caso o próximo governo decida primeiro pedir uma licença para gastar (o chamado “waiver fiscal“) e deixe para depois a definição de uma nova regra para os gastos públicos.

“As duas coisas têm de vir juntas. Se você só aprovar a licença para gastar, se colocar o carro na frente dos bois, as expectativas de inflação para o ano que vem não vão melhorar”, afirma.

“Não dá para deixar o combate à inflação inteiramente nos ombros do Banco Central. O lado fiscal e institucional precisa ser conduzido adequadamente para dar suporte à política monetária. E, até agora, esse lado fiscal e institucional não tem ajudado muito. Pelo contrário, tem prejudicado a condução da política monetária.”

Elisa Machado, economista-chefe da ARX Investimentos, afirma que é importante o BC manter o discurso de que continuará comprometido com o combate da inflação. “O Banco Central ainda tem uma batalha para ganhar, que é a batalha das expectativas de inflação. As expectativas para 2022 reagiram muito a essas mudanças tributárias, mas elas ainda estão acima da trajetória de metas para 2023 e 2024.”

Na ata da última reunião doCopom, o BC afirmou que a redução recente da inflação foi fortemente influenciada pelo corte de impostos e, em menor medida, pela queda dos preços internacionais de combustíveis.

Já os componentes mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária, que apresentam maior inércia inflacionária, mantêm-se acima do intervalo compatível com a meta para a inflação.

O BC também diz que o repasse da taxa Selic para as taxas finais de diferentes modalidades de crédito tem ocorrido conforme o esperado e que grande parte do impacto da política monetária ainda está por ser observada, tanto na atividade econômica quanto na inflação. Citou ainda como riscos a incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal do país e estímulos adicionais que impliquem sustentação da demanda.

Fonte: Folha de S. Paulo

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